domingo, 6 de maio de 2012

UM CAOS PROGRAMADO COM NOME E COM PAI




EDITORIAL



MANAUS - A última postagem feita neste blog dia 4 deste mês trata da constante, permanente e inaceitável falta de profissionais de saúde nas cidades interioranas no Estado do Amazonas. Quero pois aproveitar essa oportunidade para destacar os pontos cruciais que justificam esse tão significativo quadro e que é resultado da falta de políticas públicas eficazes voltadas para a resolução desse problema.
Inicialmente podemos fazer referência direta ao novo sistema de ingresso na universidade pública, realizado por meio do Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM, que é adotado atualmente. É claro que o sistema tem seus pontos significativos, muito embora aqui não é o mais interessante mencionar. É preciso sim dizer que existem inúmeras situações que têm contribuído para o afastamento de profissionais da saúde do interior do Estado do Amazonas. Sabemos que essa é uma situação que já perdura há muito tempo. Mas hoje a já incômoda situação desse quadro agravou-se. Primeiro, podemos dizer que os programas voltados para a educação na região Norte, notadamente no Amazonas e, peculiarmente nas cidades do interior, sempre deixaram a desejar. Os investimentos nessa área sempre foram irrelevantes e, até o momento, pouco fora feito para reverter isso, de modo que o nível educacional dessa região estagnou num dos mais negativos já registrados. Seria o investimento na educação com reflexos na saúde. Existe pouco ou quase nenhum profissional amazonense trabalhando, ocupando cargos de nível superior. Daí então que os governistas (governadores e prefeitos no Amazonas) sempre recorreram aos médicos, dentistas e enfermeiros formados nas regiões sul e sudeste, entrando ainda na seara da contratação de profissionais peruanos e colombianos sem a homologação legal de seus diplomas. Mas, é possível compreender o motivo dessa falta de profissionais da saúde na cidades do interior amazonense? Provavelmente não, mas é possível identificar alguns motivos, por exemplo, que não estimulam a vinda deles: o profissional da saúde da região sul ou sudeste, ou mesmo de Manaus, simplesmente não se adapta a vida pacata das cidades ribeirinhas (costumes, ritmo, alimentação, etc). Segundo, a pobreza no interior do Amazonas, que significa baixa qualidade de vida segundo os padrões exigidos, além da ausência de opções que as cidades grandes oferecem (shoppings, vida noturna agitada, qualidade de vida, ritmo diferente, mundo diferente), a dificuldade de acesso, limitado ao transporte aéreo e fluvial (caro e/ou demorado),  e outra, as condições salariais já não atraem esses profissionais como outrora.
Como as oportunidades para ingressar na universidade pública são raras no Amazonas, devido ao número reduzido de vagas e à baixa qualidade do ensino público, a concorrência para os interioranos fica cada dia mais difícil de ser superada. Daí que os cargos, quase em sua totalidade, ocupados pelos amazonenses são aqueles que exigem baixa escolaridade (auxiliar de serviços gerais, técnicos, porteiros, vigilantes) muito embora tenha havido pequena e insignificante mudança. Mas ainda é estranho entrar em um hospital e encontrar amazonenses na entrada (segurança), na recepção (atendente), auxiliar de enfermagem (técnicos) e em rara exceção enfermeiros amazonenses; mas é a partir daqui que vemos profissionais das outras regiões em grande quantidade (enfermeiros, dentistas e médidos, estes últimos raríssimas são as excessões).
Mas, o que o ENEM tem a ver com tudo isso? Como tem contribuído par ampliar ainda mais essa realidade desfavorável no Amazonas? Tem tudo a ver e tem contribuído com maior ênfase para agravar esse quadro. O sistema atual de seleção para preenchimento das vagas existentes para medicina (curso mais concorrido) tem privilegiado em sua totalidade estudantes das regiões onde o ensino secundário tem mais qualidade, tendo em vista que as vagas podem ser preenchidas por alunos de qualquer parte do país. Daí que os estudantes de escolas particulares oriundas dessas regiões estão vencendo com facilidade essa concorrência. E nesse processo existem dois grandes problemas: quase todos os novos médicos formados nas universidades públicas no Amazonas retornam imediatamente para seus Estados de origem, mantendo a defasagem de médicos aqui existente, e, mesmo sendo estudantes de segunda categoria, uma vez que só preencheram as vagas no Amazonas porque em seus Estados de origem não puderam concorrer com os melhores aluns do país, eliminam qualquer possibilidade de os nativos ingressarem no mundo da mão de obra qualificada na área da saúde, em função da precária preparação anteriormente mencionada. Conclui-se com isso que o sistema atual adotado pelo ENEM alimenta a elitização do ensino no país.
É nesse sentido que posso dizer que faltam políticas públicas eficientes para que isso seja mudado. É preciso regionalizar essa concorrência, para que as oportunidades possam chegar a todos; é preciso aumentar o número de vagas nas universidade públicas e oportunizar a um maior número de estudantes; é preciso mais investimentos na qualificação dos professores do ensino fundamental e secundário nas escolas públicas. Além disso, faz mister envidar esforços para fomentar o interesse pela leitura, pela pesquisa, pelos estudos de modo geral, para que os jovens amazonenses possam integrar o corpo de profissionais da elite brasileira. Vale, contudo, destacar que o jovem amazonense deve mais que nunca se conscientizar também da necessidade dessa mudança. A necessidade de mudar sua rotina é iminente, e dedicar-se aos estudos, aos preparativos para um futuro melhor e ocupar espaços que outrora eram sequer sonhados, requer transformação.
Diante dessas situações que tratamos aqui é que posso afirmar que as políticas públicas até então direcionadas para o interior do Amazonas são insignificantes. Já afirmei em outro artigo que as cifras aplicadas em Manaus são infinitamente superiores se comparadas com as das cidades interioranas. E enquanto não houver um projeto realista, um projeto humano, um projeto que trate o cidadão amazonense com respeito, com visão futurística, estaremos renegados a um mundo de conformismo, sem futuro, sem ambições, sem crescimento, sem esperança de dias melhores e sem a qualidade de vida desejada por todos.

Elaborado por Rubem Tadeu - Presidente da AFAMA


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