EDITORIAL
Dias atrás, um caso de prisão pelo não-pagamento chamou minha atenção: uma jovem teve decretada sua prisão após passar cerca de seis meses sem adimplir com suas obrigações alimentícias. A juíza que determinou a prisão não fez nada além do que preveem as regras dos artigos 732 e 735 do Código de Processo Civil. E de acordo com a Súmula n. 309 do STJ, o alimentante está sujeito à prisão civil após ficar inadimplente por pelo menos durante três meses. Vale destacar que essa prisão só pode durar no máximo dois meses, e mesmo que o alimentante não efetue o pagamento, deverá ser posto em liberdade.
Esse fato ocorreu na cidade de Taubaté (SP) e a jovem chegou a passar uma noite na cadeia. O caso na verdade não chocou por ser uma mulher que ora faz a vez da pessoa responsável pelo alimento de uma criança. Nos dias de hoje, nada mais natural, uma vez que os direitos são iguais para homens e mulheres conforme prescreve a moderna Constituição da República Federativa do Brasil, mas por estar a jovem grávida de 9 meses. Para mim um absurdo jurídico. Será que o bom senso, o respeito aos direitos do nascituro, as condições degradantes das cadeias no Brasil, os riscos de contrair doença a que estavam sujeitos a mulher e a criança, dentre outras situações perigosas, não poderiam contrabalancear a decisão de pô-la na cadeia? Até que ponto é plausível e justificável expor a saúde de uma mulher grávida e sua criança prestes a nascer? Quem mais estava correndo riscos: a criança acompanhada do pai, que por sinal trabalha e tem condições de mantê-la, ou a jovem grávida, desempregada, sendo sustentada pelos pais, devendo ter todos os cuidados para com seu filho (nascituro)?
Quando a mulher engravida, existem vários procedimentos a serem adotados por ela para que sua gravidez não seja de risco e mais do que tudo seu filho seja saudável. Aliás, é fundamental que mesmo no planejamento da gravidez a mulher realize exames básicos como pesquisa de toxoplasmose, de sífilis, hemograma completo, grupo sanguíneo e glicemia, além de HIV e inúmeras vacinas de prevenção, ou seja, é extremante importante que durante a gestação seja feito um acompanhamento sério de todas as ordens para que não ocorra má formação dos órgãos do bebê, dentre outras anomalias.
De acordo com o Dr. Marco Almeida, as grávidas devem repousar duas horas após o almoço, deitada de barriga para cima e não deixar de dormir, pelo menos 8 horas de sono tranquilo a noite; a grávida deverá evitar stress emocional, cabendo a ela obter massagens relaxantes ou outras atividades prazerosas. Portanto, caros leitores, pergunto: como poderia a jovem grávida cumprir tais medidas para o bem dela e de sua criança (nascituro) dentro de uma cadeia? Um contra-senso total.
Decerto, a juíza tomou a decisão de expedir o mandado de prisão por força da lei. Decisão simples não é? Para mim não. Que me expliquem os doutrinadores, os juristas sobre as tais interpretações da lei.
Não obstante, conclamo aos nossos legisladores que façam um estudo sobre o fato e avaliem os pontos importantes da norma. Existem vários fatores significativos que envolvem o desrespeito à criança, ao adolescente, ao idoso, à gestante, aos negros, mas qual o limite de cada cidadão?
Caros leitores, devemos cumprir e fazer cumprir a lei? Sim, não tenho dúvidas disso. Podemos criar as leis por meio dos nossos representantes (legisladores), de acordo com o valor do fato. Assim, podemos também modificá-la conforme novos conceitos e valores.
Minha preocupação quanto à situação dessa grávida inadimplente é mais com o bebê que está prestes a vir ao mundo. Vejo que não houve respeito a dignidade dessa criança, não houve respeito à vida dessa criança.
Enquanto o Estatuto da criança e do adolescente prevê proteção à criança e à gestante, enquanto o país busca diminuir a mortandade de crianças antes, durante e pós-parto, enquanto o país deseja que as crianças nasçam sadias, em condições mínimas para o seu crescimento, enquanto o país investe na saúde da criança e da gestante como prova do cumprimento das suas obrigações para com o cidadão, o Estado-Juiz quebra qualquer corrente em detrimento à desesperança, à desonra, aos maus-tratos, à tortura, pois uma medida dessa de manter uma jovem grávida de 9 meses na cadeia o desejo é de que ela aborte imediatamente.
Aqui fica meu repúdio, aqui deixo minha indignação a leitura literal da lei. Não à violência, não aos maus-trato a uma criança que sequer veio ao nosso nebuloso mundo.
Que as autoridades que têm o poder de decidir, reflitam sobre o caso, já que não é apenas uma questão de fazer cumprir, mas de refletir sobre causas e consequências, prós e contras, origem do problema e frutos a colher.
Elaborado por Rubem Tadeu - Presidente da AFAMA
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